José Pacheco: “A escola tradicional está fracassada”
Elisa ElsieEDUCAÇÃO - O professor de português José Pacheco defende um novo tipo de escola - Tribuna do Norte
Por Anna Ruth Dantas
Romper com o modelo de escola tradicional, onde não há turmas, não há séries e nem salas de aula. Essa revolução que a priori pode ser utópica foi feita há mais de 30 anos em Portugal pelo professor José Pacheco e hoje já é aplicada no Brasil. Para o especialista, o que se propõe com esse método é o mínimo, mas muito ainda há por mudar, inclusive na estrutura de gestões. José Pacheco lamenta que o Ministério da Educação, tanto no Brasil como em qualquer outro país europeu, proponha mudanças, reformas, mas o modelo tradicional continue o mesmo. A idéia do professor José Pacheco é oferecer ao aluno a liberdade de aprender. “Mas, ele cumpre toda grade curricular porque nesse método o professor não é descartável, ele é um instrutor que leva o aluno a conhecer e amar. Porque só se ama aquilo que conhecemos”, observa o professor, que esteve em Natal visitando a Casa Escola.
José Pacheco não defende uma revolução apenas no método de aprendizagem, mas também na administração da própria escola. E nesse aspecto entrega a direção do colégio aos pais. Aliás, quando assumiu a Escola da Ponte em Portugal, exatamente o colégio onde iniciou o método, a primeira ação como diretor foi entregar o colégio para a direção da escola. “Portanto, como diretor foi meu único ato e com isso deixei de ser diretor”, comenta.
O entrevistado de hoje do 3 por 4 é um professor que, pelas idéias, soa como vanguardista na educação, embora não se considere, um verdadeiro defensor da educação e um especialista que fala com simplicidade de uma das suas grandes paixões: a Escola da Ponte, onde todo esse novo trabalho na educação começou.
TRIBUNA DO NORTE - Esse método que o senhor foi desenvolvendo significa o fracasso do método tradicional da escola?
José Pacheco - Não sei se posso chamar de método. É um conjunto de métodos e tem a ver com o fracasso do método da escola dita tradicional, aquela mais comum. Tudo que eu vou dizer tem tanta importância quanto aquilo que os outros fazem, mesmo que trabalhem com um método que eu não concordo. Tem a ver com a falência da escola que temos hoje. Essa escola de hoje produz o insucesso dos alunos e leva o Brasil para os lugares mais baixos dos estudos; temos o Rio Grande do Norte no 27º lugar no Enem. Qualquer coisa está errada. Esse método, vamos falar assim, surgiu em uma situação muito delicada. Há 32 anos, a Escola da Ponte, uma escolinha em Portugal, tinha alunos na quarta série sem saber ler e escrever, eram alunos que batiam em professores e iam para o hospital, alunos que estavam bêbados, que chegavam a cheirar mal, a escola não tinha banheiro, não tinha porta. Era a pobreza associada ao ensino. Partimos para estudar, para ver o que estava errado. E partimos exatamente do bom senso e ficamos a pensar: será que esses alunos não apreendem e são violentos ou será que a forma tradicional os ensina a serem violentados? Então compreendemos que eles tinham dificuldade de aprendizagem. E fomos ver por que havia insucesso. Fui para os livros de Pedagogia e Filosofia. Procuramos fundamentação teórica para a existência de série, turma, aula e prova. E os resultados foram que em nada há fundamentação teórica para haver série, aula, prova e turma. Não há nada.
TN - O que o senhor procura quebrar com esse novo método, não é complicado para o aluno que já está no método tradicional? Não poderia ter um efeito reverso para o estudante, confundi-lo mais do que ajudá-lo?
JP - Não temos turma, prova, aula, diretor, nem livro de ponto, não temos nada disso. E não precisamos. Nós procuramos uma cultura profunda. Vou ser presunçoso e orgulhoso. Presunçoso para dizer que foi a primeira vez na história da educação em que se mudou uma cultura total com o modelo tradicional. Agora serei vaidoso. Agora vou ser orgulhoso e dizer que fui eu quem fez isso, mas foi coletivo e muita gente foi envolvida. Nós poderíamos ter feito uma cultura com o ensino tradicional, deixar de dar aula e ter sido um fracasso. Mas sou vaidoso, ao fim de 30 anos, essa escola que era daquele jeito foi fazer a prova nacional e os melhores alunos, de todas as escolas eram da Escola da Ponte. Ou seja, sou presunçoso por contar a história e dizer depois da Ponte é outra história criada. Sou vaidoso ao dizer que os nossos melhores alunos são os melhores.
TN - Como o senhor consegue desenvolver um método que quebra toda a logística organizacional de uma escola?
JP - A Escola da Ponte parece que está muito avançada, mas ainda está muito atrasada. Aqui no Brasil vai acontecer muito mais que aconteceu em Portugal. Digo isso sem medo de errar porque escola não é aula. A Escola da Ponte ainda tem um prédio, um edifício. Mas a escola deve ser todo lugar e tempo de aprender. O aluno não é dos cinco anos aos 20 anos, o aluno é do zero aos 120 anos. E os professores são aqueles dentro da escola, os professores somos todos.
TN - Mas quando o aluno chega à escola ele se enquadra em um grupo, é preciso organização. Como o senhor desenvolve, dentro dessa idéia de acabar com turma e série, a divisão dos grupos de alunos?
JP - É muito difícil realmente. Tenho dito que o modo como o professor aprende é o método como ele ensina. O modo como o pai aprendeu é o modo que ele quer para o filho. Para nós é extremamente estranho não ter turma. Mas veja só, há dificuldade, é verdade. E o primeiro obstáculo sou eu e minha cultura tradicional. Fui educado desde tenra idade, fui educado a trabalhar sozinho, na minha sala, com meus alunos. O professor não pode continuar a trabalhar sozinho em um lugar. Na minha escola ninguém está sozinho, o professor não está sozinho. O segundo nível de dificuldade são os pais que não entendem o método. Os pais são inteligentes e nós conversamos com os mesmos, eles entendem depois de alguns meses quando vêem que aquilo que mudamos produz um melhor resultado. Por exemplo, que os filhos aprendem a ler em dois meses quando nas outras escolas demoram um ano e meio. Os pais quando vêem o resultado apóiam e defendem. Mas há outra dificuldade, o nível político. O Ministério da Educação é um obstáculo. Aliás, se o Ministério fosse extinto não se perderia nada, se ganharia, extinguir o Ministério da Educação.
TN - Mas essa extinção seria no Brasil também ou só na Europa, onde está o pioneirismo do seu método?
JP - Em todo o Brasil. Cientificamente os ministérios têm pessoas muito bem qualificadas, mas que não servem para nada. Fazem programas, projetos, reformas que não reformam nada A escola continua do mesmo jeito, tem computador, mas o ensino é o mesmo. Outro nível de dificuldade são os alunos. Eles reagem mal. Os alunos não entendem. Mas na minha escola quem faz o planejamento são os alunos, quem avalia são os alunos, quem decide o que fazer são os alunos. Quem governa a escola em direitos e deveres são os alunos. Por isso é que nossos ex-alunos que têm agora 40 ou 45 anos de idade, são cidadãos conscientes dos seus direitos e deveres.
TN - No início do ano, quando o aluno chega, como o senhor divide os grupos?
JP - Os que estão lá já está mais fácil. Mas aqueles que chegam nós não dividimos. Eles escolhem como querem trabalhar. Por que temos que dividir por idade? O outro que está ao seu lado é único e difere na aprendizagem. Cada ser humano é único e dotado do estilo de vida, traz um determinado ritmo de aprendizagem, dotado de uma determinada cultura, dotado de uma aprendizagem diferente. Por que todos têm que aprender na mesma turma, no mesmo horário com as mesmas pessoas?
TN - Esse livre arbítrio dado ao aluno não estaria segmentando o estudante que deixa de conhecer outras disciplinas com as quais a priori não teria afinidade?
JP - Há muitos trabalhos sobre a Ponte. Séries de doutorado, mestrado provam que os alunos são capazes de estudar tudo, eles fazem toda grade curricular mais rapidamente do que as outras escolas. Nenhum sai da Ponte da nona série sem dar a grade curricular. Lógico que têm aqueles que gostam de determinado assunto mais do que o outro e o professor não é descartável. Ele age como um mediador e facilitador, ele leva o aluno a outro segmento. Dar a idéia do aluno fazer aquilo que quer, mas não é bem assim. Ele faz o que quer com responsabilidade. E há um currículo, uma grade curricular, uma grade curricular de pleno direito que precisa ser dada. Ninguém é cidadão de grande direito se não souber matemática. Tem que estudar, mas precisa compreender o que e por que estuda. Aí está a diferença da Escola da Ponte. Aprende e aprende porque se aprende. Na maioria das escolas portuguesas a disciplina musical não é trabalhada, mas na nossa não. Mas há questões que o aluno por sua própria vontade nunca vai estudar. Ele nunca vai querer ouvir Mozart ou Bethoven, tem que ser o professor para ele conhecer e amar. Só se ama aquilo que se conhece.
TN - E sobre esse método, os alunos se agrupam por afinidade, e aí também não seria uma divisão de segmentos de aprendizagem?
JP - São três critérios: primeiro se eu gosto de trabalhar contigo, trabalho contigo. Se estou querendo aprender o mesmo projeto, trabalho contigo que tem o mesmo projeto. Terceiro critério esse é o projeto da escola, em cada grupo precisa haver alguém que precisa de mais ajuda. E aí está a formação da cidadania. Recebemos jovens que vêm com síndrome de down, paralisia cerebral. Tudo vem para a Ponte, as outras escolas jogam fora.
TN - Seria ignorância das escolas que discriminam essas crianças com deficiências?
JP - Não quero falar mal das outras escolas porque sou professor e sou responsável individualmente pelos outros professores. Não digo nada. Mas digo que recebemos esses jovens, jovem que foge das outras escolas e veja que nas outras escolas têm vigilante, portão magnético e muro. Na minha escola não há portão, não há nada e eles não fogem.
TN - No Brasil se discute a implantação de ensino religioso, sexual.
JP - Todo homem é religioso, todo jovem quer esclarecimento de cunho afetivo, todo ser tem que ser feliz, cidadão e sábio. Trabalhamos isso tudo, mas não por série, trabalhamos quando a criança solicita ou quando consideramos oportuno. Mas não está dissociado do resto. Quando mandaram para as escolas portuguesas que era a educação para a cidadania, que era para o trânsito, educação para o consumo, sexual. Nós recusamos porque ao invés de educação para cidadania nós educamos na cidadania, no exercício da liberdade responsável, trabalhando com crianças nas suas angústias existenciais, nas suas dúvidas, nas suas questões de ordem social, em qualquer momento, em qualquer idade.
TN - E nesse seu método, onde está a responsabilidade dos pais?
JP - Total. Basta dizer que a Escola da Ponte é da rede pública e quem dirige a escola são os pais. É a única escola no mundo que os pais dirigem. São os pais que defendem as escolas.
O modelo de escola tradicional fica muito a desejar pois o aluno precisa ser critico questionador e se envolver nas atividades assim como o educador precisa conhecer a realidade do aluno na sala de aula e o docente precisa ser dinâmico para chamar a atenção do aluno para apreender diversas atividades existentes e que apartir desse momento ele possar também fazer com que haja uma interação com os alunos
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