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24/08/2013

ESPERANÇA DE UM BRASIL MELHOR


DA REVISTA PÁTIO

José Pacheco para mim é alguém além de nosso tempo. Visionário da Educação Ideal, meu ícone. Ao ler os seus textos sinto como se já tivéssemos conversado sobre assunto, pois é tudo o que acredito.



Entrevista // José Pacheco

Ele ficou famoso como idealizador do projeto da Escola da Ponte, que aposta na autonomia dos alunos para educar. Hoje compartilha o conhecimento adquirido em sua trajetória em Portugal com os brasileiros, acompanhando escolas, universidades e secretarias de educação em busca de novos caminhos na educação. “Há muitos países dentro do Brasil e muitas escolas, todas diferentes, mas tenho notícia de mais de uma centena delas e de milhares de professores que, cada qual a seu modo, melhoram as suas práticas”, afirma José Pacheco, mestre em Ciências da Educação pela Universidade do Porto. Nesta entrevista, ele analisa a educação brasileira e propõe caminhos. “O Brasil tem em si tudo aquilo que precisa para fazer uma educação de excelência. Basta que sejam oferecidas as condições de mudança aos que querem mudar”, afirma. “O trabalho realizado por educadores, gestores, titulares de cargos públicos alimenta a minha secreta esperança de um Brasil melhor, mas suspeito que ainda haja escolas, universidades e secretarias distraídas...”
Na última década, O Brasil tem obtido significativos avanços no campo econômico e social, mas esses avanços não estão sendo acompanhados pela educação, conforme avaliações nacionais e internacionais. Como o senhor analisa essa situação?
Eis o drama educacional brasileiro: jovens do século XXI são ensinados por professores do século XX, com recurso a práticas do século XIX, em práticas desprovidas de fundamentação científica, responsáveis pela triste realidade de um Brasil que, sendo a sexta ou sétima economia do mundo, está nos últimos lugares dos rankings da educação. A tragédia dos 30 milhões de analfabetos que a velha escola produziu no Brasil constitui-se em incômoda evidência, em um dos graves efeitos da crença em um modelo epistemológico falido.
 
Que outros fatores contribuem para formar tal cenário?
Predomina nas escolas uma cultura assente no individualismo, na competição desenfreada, na ausência de trabalho em equipe, na ausência de verdadeiros projetos. Nas decisões de política educativa, prevalece o discurso de economistas, engenheiros, técnicos de informática, jornalistas, gestores, diretores de marketing, ex-ministros, empresários — todas elas pessoas de boa vontade, mas desprovidas de conhecimento pedagógico. A racionalidade técnico-instrumental pontifica nos eventos em que aqueles que a mídia classifica de “especialistas” produzem “aulas magnas” e os pedagogos são minoria quase ostracizada.
 
O que poderia ser feito para promover mudanças?
Talvez devamos apelar ao bom senso dos titulares do poder público, pedir-lhes que estejam atentos a excelentes práticas que muitos educadores brasileiros vêm produzindo, sem importação de modas pedagógicas, que são o contraponto da construção social “escola” que a modernidade nos deixou como herança. A velha escola há de parir uma nova educação, mas as dores do parto serão intensas, enquanto a tecnocracia e a burocracia continuarem a invadir domínios nos quais deveria prevalecer a pedagogia. 
  
A educação brasileira quase venceu o desafio de incluir todos aqueles em idade escolar. O que falta para avançar também na qualidade?
Ouso discordar, pois continuam “evadidos” (que estranho termo…) da escola cerca de quatro milhões de jovens. Conceitos concebidos originalmente no âmbito da educação com preocupações emancipatórias foram vulgarizados e reinterpretados em práticas com finalidades de teor tecnocrático. Expressões e conceitos como empowerment, cidadania, excelência acadêmica e qualidade da educação constituem-se em uma amálgama de difícil decifração. E a busca de uma escola que ofereça a melhor educação possível ainda hoje acontece imersa em equívocos. Talvez por ser um conceito polissêmico, o conceito de “qualidade” é objeto de múltiplas interpretações. Eu diria que educação de qualidade é aquela que produz seres mais sábios e pessoas mais felizes. Para melhorar a qualidade, talvez falte apenas cumprir a Lei de Diretrizes e Bases. Um projeto educacional é um projeto de sociedade, e todas as escolas dispõem de um projeto político-pedagógico (PPP) que lhes outorga o direito e a missão de educar. Contudo, os PPP parecem ser apenas políticos e pedagógicos na redação, porque, na prática, a teoria talvez seja outra.
 
Poderia dar um exemplo?
Se uma escola escreve em seu PPP a intenção de fazer dos seus alunos cidadãos autônomos, como poderá lograr atingir esse objetivo “dando aula”? Será possível desenvolver autonomia nos alunos se um professor não é autônomo e recorre a práticas geradoras de heteronomia? Um professor não ensina aquilo que diz; um professor transmite aquilo que é.
 
O poder público, especialmente o governo federal, tem promovido grandes investimentos na educação básica e superior, mas parece que isso ainda não tem sido suficiente para melhorar a qualidade da educação nacional. Como o senhor analisa esses esforços?
Já na primeira metade do século passado, Lourenço Filho viveu as agruras de tentar melhorar a educação do Ceará e de São Paulo. Dessa dura experiência concluiu que “a escola tradicional não serve o povo, porque está montada em uma concepção social já vencida”. Hoje é comum verificar que a utilização de quadros interativos e o recurso a tablets, por exemplo, são considerados indicadores de qualidade, quando apenas contribuem para reforçar práticas de mesmice, características de “uma concepção social já vencida”. É bem verdade que têm sido avultados os investimentos; porém, apesar das medidas apontadas e da profusão de tentativas de reforma, programas, projetos, congressos, cursos e afins, não se logrou melhorar a qualidade da educação nacional. Nem esse desiderato será alcançado enquanto as escolas continuarem cativas de um modelo educacional obsoleto e de uma gestão burocratizada, na qual os critérios de natureza administrativa se sobrepõem aos critérios de natureza pedagógica.
 
O senhor aponta alguma ação positiva?
Um bom exemplo de iniciativa ministerial é o programa Mais Educação; contudo, a interpretação prática de uma proposta de elevado potencial redundou, em muitas escolas, na criação de “contraturnos” feitos de atividades desconexas, transformando o turno integral em uma dose dupla de tédio. O desvirtuamento da proposta também passou por preencher o tempo de desculpabilização curricular, com “aulas de reforço”, ou outros sucedâneos e aberrações decorrentes de um modelo de escola hegemônico, verdadeiro obstáculo ao desenvolvimento humano. 
 
Há várias décadas, a sociedade brasileira tem tomado para si a responsabilidade de contribuir mais efetivamente para a educação. Como analisar esses movimentos e seu papel na melhoria da educação?
É bem verdade que ONGs, institutos e fundações desenvolvem programas educacionais de grande valia. O que surpreende é o fato de essas instituições servirem para colmatar erros de medidas de política educativa. Não creio que o papel das ONGs deva ser o de mitigar, mas sim o de mostrar alternativas a políticas públicas produtoras de Idebs miseráveis, marcadas por denúncias de corrupção na merenda escolar, no transporte escolar, e pelo despudor de se desperdiçarem, em cada ano letivo, cerca de 56 bilhões de reais.  
 
Comparada a outros países emergentes, especialmente os asiáticos, sobressai ainda mais a defasagem educacional brasileira. O Brasil deveria prestar mais atenção a esses modelos? 
Não creio que um português possa elencar modelos que possam contribuir para a redução ou mesmo a eliminação de tal defasagem. As suas causas são múltiplas e complexas. Não sei se deveremos prestar mais atenção aos modelos que vêm de países emergentes, nem sequer àqueles que vêm do norte. Lamento que se continuem a estudar teorias fósseis e a importar modelos europeus e norte-americanos, ou que não haja nas bibliotecas das faculdades de pedagogia livros de autores brasileiros, como Lauro de Oliveira Lima. Estejamos atentos ao aviso que nos legou Fernando Azevedo: nem tudo aquilo que é bom para os Estados Unidos é bom para o Brasil. Temo que o Brasil da educação deixe-se seduzir por modelos alheios. Temo, por exemplo, que as novas tecnologias sirvam para congelar aulas em computadores, aulas que os alunos “skinerianamente” consumam, sem resquícios de cooperação com o aluno vizinho, dependentes de vínculos afetivos precários, estabelecidos com identidades virtuais. Qualquer que seja o “modelo”, evitemos replicar aulas congeladas no YouTube e em tablets. Usemos o digital a serviço da humanização da escola. 
 
Uma das questões em evidência é a falta de qualificação dos profissionais para o trabalho. Isso demonstra a inadequação da escola à realidade? 
É deveras preocupante que titulares de diploma de Direito não consigam aprovação no exame da Ordem dos Advogados, ou que engenheiros estrangeiros ocupem postos de trabalho para os quais os brasileiros manifestam total inaptidão. Talvez sejam “evidências” da inadequação do modelo de escola que ainda temos.
 
Como a escola deve reorganizar-se para acompanhar a evolução da sociedade?
Talvez a escola possa reorganizar-se operando uma definitiva ruptura com o velho paradigma, eliminando erros do modelo de formação. Não duvido que as universidades disponham de excelentes professores, mas a formação docente continua imersa em equívocos. Ainda há quem creia que a teoria pode preceder a prática e encha a cabeça do formando de tralha cognitiva, ingenuamente acreditando que ele irá “aplicá-la” na sala de aula. Ainda há formadores que adestram formandos no planejamento de aula, quando deveriam prescindir dessa inútil herança de práticas sociais do século XIX. Ainda há quem considere o formando como objeto de formação, quando deveria ser tomado como sujeito em transformação. 
 
Algumas escolas estão aumentando a carga horária de língua portuguesa e matemática em função do péssimo desempenho em avaliações nessas disciplinas. Tal medida pode contribuir para a melhoria da qualidade da educação no Brasil?
É evidente que tais medidas em nada contribuem para a melhoria da qualidade da educação no Brasil. Os seus autores terão lido conclusões de pesquisas? Terão um mínimo de conhecimento teórico? Duvido. Medidas como o aumento de carga horária ou do número de dias letivos, a introdução de mais provas e exames, a colocação de um segundo professor na sala de aula, a atribuição de bônus a professores são habilidades avulsas, sem fundamento na ciência, nem sequer no bom senso. Está na moda o “destaque” da Finlândia, mas não se diz que as escolas finlandesas têm a autonomia que as do Brasil não têm. Enquanto o Ministério da Educação do Brasil alberga muitos milhares de funcionários, na Finlândia eles se contam por poucas dezenas. E, na Finlândia, não há exames, nem vestibular… 
 
O que deveria ser feito nesse caso?
Seria útil rever currículos. As ditas “grades” de língua portuguesa, por exemplo, são amontoa­dos de conteúdos inúteis. Para que serve decorar termos como “dígrafo” ou expressões como “sujeito nulo subentendido”? O leitor saberá o que são “plantas epífitas” ou em que consiste um “ato ilocutório diretivo”? Nem eu sei! Mas os alunos são receptáculos de uma acumulação cognitiva que nem mil horas de “carga” poderiam contemplar. Quando aluno, fiz decoreba dos afluentes da margem esquerda de rios africanos e outras lenga-lengas que me ocupam a memória de longo prazo e que não me fizeram mais sábio nem mais feliz.
 
Nessa revisão de currículos, o que se deveria priorizar?
Sabemos que o desenvolvimento estético anda a par do desenvolvimento cognitivo, já que eles são mutuamente influenciados. No entanto, sofremos da fragmentação dos saberes e da perda do sentido da totalidade. É preocupante, por exemplo, assistir ao aumento da “carga” de disciplinas “nobres”, enquanto se reduz a “carga” da formação estética quando se considera que a formação artística é mero entretenimento. Fico deveras preocupado com o desperdício de oportunidades. Sempre que a mídia alerta para qualquer mazela do sistema, a reação top-down é a de lançar mais um programa, mais um pacto, que raramente será avaliado e terá o mesmo inglório destino: o insucesso.
 
É possível acreditar que, em um futuro próximo, o Brasil será destaque não apenas no noticiário econômico, mas também educacional?  
São muitas as escolas brasileiras que agem em coerência com os seus PPP, concretizando uma educação integral, em uma escola integrada, em tempo integral. Já são visíveis os excelentes efeitos alcançados, o alcance da excelência acadêmica, além da garantia da inclusão social. Temos razões para acreditar que o Brasil pode ser “destaque”. Escutemos os mestres Agostinho, Anísio, Azevedo, Nilde, Darcy, Florestan, Lourenço, Lauro e tantos outros que continuam à espera de ser lidos e compreendidos. Quando comunidades de aprendizagem estiverem consolidadas em redes de aprendizagem colaborativa e as escolas forem lócus de desenvolvimento sustentável, serão interpeladas as políticas públicas e negociados termos de autonomia, que confiram aos protagonistas dos projetos a dignidade de decidir e ser responsáveis. E, se alguém pensa que toda essa arenga é utopia, direi que já está a acontecer… no Brasil.

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