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31/03/2008

CONTRIBUIÇÕES DE PIAGET E VYGOTSKI PARA A EDUCAÇÃO

Por Sérgio Roberto Kieling Franco


Certa vez um jornalista me perguntou para que serve o construtivismo. E isso me fez pensar bastante e cheguei à conclusão de que, a princípio, não serve para nada. Aliás, aqui é importante fazer uma generalização. As teorias, bem como as filosofias não servem para nada.
Vocês devem estar achando estranho eu dizer isso, ainda mais quem me conhece há mais tempo e sabe do meu empenho em traduzir a teoria de Piaget em uma linguagem mais simples com o intuito de fazer os professores, ou mesmo os pais entenderem o construtivismo.
É bem verdade que eu sempre fui um defensor das teorias. Sempre gostei de caracterizar meus cursos, minhas aulas, como espaços de reflexão teórica. Mas tudo isso não é incoerente com o que disse acima: que as teorias não servem para nada.
De fato estou querendo afirmar que não é possível dar um caráter pragmático à teoria. Afinal, falando-se de educação, alguém pode conhecer profundamente uma série de teorias pedagógicas, e no entanto não ser um bom professor. Do mesmo modo todos nós conhecemos professores que não conhecem teorias, que agem muito mais por instinto e são excelentes na sala de aula.
O problema é que intuição não garante profissionalismo. Uma coisa é saber utilizar procedimentos didáticos adequadamente, outra é ter critérios claros e precisos que nos auxiliem a julgar e a escolher os procedimentos a serem utilizados e também a fazer opções relativas a sua adaptação. Mas a construção desses critérios não algo que acontece da noite para o dia, nem provoca mudanças imediatas na nossa prática. É neste sentido que a teoria não tem uma utilização pragmática. Ou seja, não tem como ensinar alguém a ser construtivista em um curso de 40 horas de modo que ele saia dali como um professor radicalmente diferente, superando todas suas deficiências de formação e todos seus vícios neuróticos que marcam sua maneira de se relacionar na sala de aula.




As duas teorias que são foco neste painel têm ainda uma característica peculiar: não são teorias pedagógicas. Apesar de exercerem enorme influência na prática pedagógica no mundo inteiro, sua aplicação está longe de ser imediata.
Vygotski tem um certo privilégio em relação a Piaget, pelo fato de ter esboçado uma teoria psicológica, e há muito tempo a psicologia tem sido um dos pontos de apoio da pedagogia. Às vezes até mesmo tornando-se quase que o centro do pensamento pedagógico. Já a teoria de Piaget não pode ser encarada como uma teoria psicológica, pelo menos não no sentido usual que damos à Psicologia. A preocupação de Piaget era epistemológica, ou seja, explicar como pode se produzir o conhecimento científico e as ciências. Para chegar a isso ele teve de fazer um caminho pela Psicologia, já que a proposta dele era de uma Epistemologia científica, baseada em pesquisas experimentais e não em especulações filosóficas. Por isso a opção por fazer uma Epistemologia Genética.
Por outro lado Piaget leva uma vantagem sobre Vygotski por ter construído uma teoria muito sólida, fundamentada em pesquisas realizadas durante aproximadamente 50 anos. tendo tido o tempo que Vygotski não teve, e sem a censura que este teve, para fazer as correções de rumo e construir um "edifício teórico" majestoso.
Se essas teorias não são pedagógicas. Se as teorias, especialmente aquelas que se relacionam indiretamente com nossa prática, não têm utilidade, então para que conhecê-las?
Costumo dizer que uma teoria é como um par de óculos. Por se tratar de uma tentativa de explicação da realidade nos faz enxergar de maneira diferente essa realidade.
O diferencial dessas duas teorias em relação a outras tantas que foram aproveitadas nos meios pedagógicos é que se tratam de concepções dialéticas. Ou seja, ambas procuram superar a visão linear que enfatiza o processo de desenvolvimento, ou mesmo de aprendizagem do sujeito, de fora para dentro ou de dentro para fora.
Isso quer dizer que são teorias interacionistas.
Alguém poderá estar se perguntando se não estou distorcendo, afinal é costume dizer-se que Vygotski é interacionista, enquanto que Piaget é construtivista. Trata-se neste caso de uma simplificação feita pelos carimbadores de plantão que precisam estar o tempo todo classificando as teorias, as propostas, as políticas, e que às vezes nem sequer conhecem direito o que estão a carimbar.
Realmente Piaget deu ênfase em seus estudos ao caráter construtivo, ou seja, das construções realizadas pelo sujeito. Já Vygotski deu ênfase aos processos de trocas, ou seja, de interação do sujeito com seu meio, principalmente seu meio social e cultural. O que os carimbadores esquecem é que para Piaget as construções são possíveis graças à interação do sujeito com seu meio (físico e social), e ao enfatizar a ação como o princípio básico, está afirmando exatamente a impossibilidade de haver construções sem a interação.


O problema todo está na dificuldade de se compreender o que seja interação, já que a tradição ocidental, e portanto também o senso comum, se baseiam em concepções lineares e não dialéticas. Um exemplo disso é a pergunta muitas vezes repetidas nas discussões pedagógicas e psicológicas: " o que pesa mais: o que vem de dentro ou o que vem de fora?"
A compreensão da realidade de forma dialética (interacionista) nos exige compreender que não se pode ficar procurando o vencedor na batalha entre o que é de dentro e o que é de fora. É por isso que Piaget propõe outro questionamento que é como o de dentro e o de fora se relacionam.
Por isso que não tem nada de construtivista (muito menos de interacionista) a prática pedagógica que se funda em "deixar que o aluno construa sozinho, sem interferência do professor". Assim como não tem nada de construtivista aquela que quer fazer com que os alunos se tornem alfabéticos até o final de tal bimestre, como se fosse possível controlar a aprendizagem desses alunos.
Penso que as contribuições dessas teorias para a prática pedagógica passam necessariamente pela possibilidade de se compreender melhor a dinâmica dos processos que acontecem no ato de ensinar/aprender.
É neste sentido que podemos visualizar a contribuição da teoria piagetiana, em primeiro lugar (em ordem temporal de acontecimento na educação e não em ordem de importância) a compreensão dos estágios do desenvolvimento cognitivo. Piaget faz uma demonstração tácita de que a criança pensa de modo diferente do adulto, demonstrando inclusive as estruturas de conjunto que caracterizam cada estágio, possibilitando que se possa entender melhor como a criança pensa, sem fazer dela um adulto em miniatura nem reduzi-la à condição de um bichinho que precisa ser treinado para se transformar (de fora para dentro) em um adulto.
Claro que uma leitura linear dessa teorização sobre os estágios fez com que se fizesse afirmações incoerentes com a concepção piagetiana, como por exemplo, o que se pregou por muito tempo, de que não se pode ensinar a criança nem além nem aquém do estágio em que ela está. Transformava-se assim os estágios em uma camisa de força. Este tipo de afirmação não contempla a concepção dialética que tem como base a dinamicidade dos processos e que a criança, ou o aprendiz vai movimentar-se com as estruturas previamente construídas por ele para compreender o novo, inclusive resgatando processos mais primitivos, se for o caso, mas por outro lado, se esse conhecimento ensinado não for de certo modo além das capacidades do aluno, ele não ficará desafiado a construir novas estruturas.
O interessante é que isso fica muito mais didático na explicação vygotskiana da zona de desenvolvimento proximal.
Uma outra contribuição largamente conhecida da teoria piagetiana para a Educação são as descobertas da Emilia Ferreiro a respeito da psicogênese da língua escrita. Compreender que o alfabetizando não aprende a escrever porque copia o que lhe é mostrado, mas porque formula hipóteses explicativas para o mecanismo da escrita nos fez dar um salto qualitativo enorme para uma alfabetização mais eficaz, além de nos ajudar a compreender certos fenômenos classificados sob o carimbo da disgrafia, ou da disortografia.
Há um conceito de Piaget ainda pouco explorado na literatura mas que pode nos ajudar a compreender de forma bem mais completa o processo de aquisição de conhecimentos, e, por extensão, de aprendizagem. Trata-se da noção de abstração reflexionante.
A teoria da abstração nos demonstra como podemos construir novidades no nosso pensamento. Através dela Piaget pôde demonstrar de forma mais completa porque não se ensina de forma determinista um conhecimento novo. Porque esse conhecimento não é fruto nem da maturação do aprendente nem da imposição do ensinante ou do material didático, ou mesmo da experiência empírica (desculpem a redundância).
Ao afirmar que todo conhecimento novo é construído porque se retira essa novidade das coordenações das ações ou das coordenações das coordenações de ações, e não diretamente dos observáveis (objetos e ações), Piaget está nos mostrando que não basta apresentar o conteúdo para que o aluno aprenda. É preciso criar situações para que esse aluno estabeleça relações. Para que faça relações entre relações, de modo que faça construções renovadas e reinvente as noções que se está querendo que ele aprenda. Só assim se alcança a compreensão de um conhecimento. É nesta perspectiva que faz sentido a frase de Piaget de que "tudo que se ensina à criança a impede de inventar ou de descobrir".
Gostaria de centrar-me mais neste aspecto de trabalhar as relações.
Quanto mais estudo Piaget, Vygotski, Paulo Freire e outros, e quanto mais discuto e converso com professores que estão no dia-a-dia da escola lutando para que seus alunos não se tornem simplesmente repetidores de matéria, mas que aprendam a lidar melhor com o mundo (e não serem lidados pelo mundo) utilizando os conteúdos ensinados na escola, mais me convenço de que o centro do trabalho educativo devem ser as relações e não os conteúdos.
Não estou dizendo que os conteúdos não sejam importantes, mas se a possibilidade da construção de noções novas está no estabelecimento de relações sobre relações ou coordenações sobre coordenações, o nosso aluno só poderá compreender o que lhe ensinamos se dermos oportunidade para que ele estabeleça relações diversas (muito mais do que aquelas poucas que nós como professores podemos preparar para que ele faça) dos vários aspectos que compõe o conteúdo e do conteúdo com outros conteúdos e situações. Afinal, como Piaget demonstra bem, através de conceitos como o da implicação significante, que são as relações que nos possibilitam dar significação. e essa significação depende portanto das ações que o sujeito executa, que são na verdade interações e não simplesmente da significação apontada pelos outros que o rodeiam.
Para finalizar quero reforçar a idéia de que as teorias de Piaget e de Vygotski vão ser importantes para a educação à medida em que nos ajudarem a ver de modo diferente os fenômenos que envolvem a mesma. Elas não são de forma alguma a panacéia dos problemas da educação. No entanto não acredito em nenhum caminho que se possa trilhar na educação, desde a Psicopedagogia, até a gestão escolar que não parta de princípios dialéticos, que entenda que a realidade não é explicável a partir de um esquema simplório de causa/efeito ou antes/depois, mas sim de uma compreensão de que essa realidade se organiza como rede de relações, e que, portanto, toda iniciativa deve ter presente que não terá condições de mudar tudo, mas que não deixará de dar sua marca.
É neste sentido que faz-se necessário buscar um complemento para as contribuições desses dois mestres do século XX em outros não menos brilhantes como Freud e Paulo Freire, bem como em tantos outros que nos abrem a perspectiva de uma compreensão dialética dos fenômenos educacionais. Neste sentido não me parece necessário constituir nenhum construtivismo pós ou dêutero-piagetiano, o que precisamos é construir uma teoria pedagógica que dê conta mais proximamente dessa dinâmica da rede, embora a compreensão total dessa rede seja impossível.

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