Sempre que me deparo com uma
máquina, mesmo que seja um simples torno mecânico, fico impressionado com o
acúmulo de conhecimento, experimentos e trabalho humanos que possibilitaram a
sua fabricação.
E digo a mim mesmo: “Se dependesse
de mim, esta máquina não teria sido feita”.
É verdade. De mim e todos os
poetas, pintores, músicos, filósofos... que jamais seriam capazes – a exceção é
Da Vinci – de pensar a realidade em termos práticos, técnicos, com o propósito
de resolver problemas de vital importância para as pessoas. Se dependesse de
nós, poetas, artistas, filósofos, a humanidade ainda estaria na idade da pedra.
Faz algumas semanas, passei
com o carro em cima de um buraco e uma das rodas empenou. Levei-o a uma oficina
e fiquei observando o trabalho do mecânico. Mais uma vez me deslumbrei com a
quantidade de conhecimento transformado em tecnologia posta em função para
resolver o problema daquela roda empenada. E ficava claro para mim, a cada ação
das máquinas e ferramentas, como, ao longo dos anos, pequenas descobertas,
inovações, aperfeiçoamentos, em
diferentes campos, foram se encadeando e juntando para tornar mais eficaz e
precisa a máquina de hoje.
E isto apenas ali, naquele mínimo
campo da tecnologia. O que dizer então das complexas e sofisticadas máquinas
que movem a civilização contemporânea?!
É, nós, poetas, não servimos
pra nada...
Será mesmo verdade que não
servimos pra nada? Seria se tudo o que importasse na vida das pessoas fossem as
questões materiais e práticas. Mas não é assim. Os técnicos, os engenheiros, os
operários, os inventores, os empresários, para seguirem adiante, necessitam de
um outro tipo de combustível que se não extrai do petróleo nem dos átomos:
necessitam dar sentido à sua vida, ao seu trabalho; necessitam de poesia, de
sonho, de algum tipo de transcendência ou simplesmente de alegria.
A época moderna,
particularmente o século XX, caracterizou-se pela confiança na ciência, na
técnica, na objetividade e na razão; a contrapartida foi a subestimação dos
valores ditos espirituais, particularmente os mais ligados à emoção e à
intuição. Se é certo que há uma arte do século XX e que essa arte ganhou peso e
visibilidade na sociedade contemporânea, é impossível ignorar o quanto influiu
nela a intenção de substituir o poético pelo científico, o intuitivo pelo
racional, e como isso contribuiu para a crise a que ela chegou em nossos dias.
Pode parecer contraditório o que digo, quando se considera que um dos traços
importantes da arte contemporânea é a irracionalidade e o nonsense. A contradição
é aparente: os polos opostos se atraem.
Mas o meu propósito aqui não é
discutir os problemas da arte contemporânea e sim afirmar a importância
crescente da arte – em suas diferentes manifestações – para o homem de hoje. Mais
uma vez posso parecer contraditório, pois logo acudirá ao leitor uma indagação
pertinente: a arte, em nossos dias, não está sendo cada vez mais substituída
pelo entretenimento? não é a música de má qualidade que prepondera? não é o pop star de duvidoso
talento que ocupa o maior espaço na mídia? e isso não se estende também ao
próprio campo da literatura?
Tudo isso em grande parte é
verdade. E esta é precisamente a razão por que, mais que nunca, devemos
valorizar a melhor música, o melhor cinema, o melhor teatro, a melhor pintura,
a melhor poesia. Certamente não seremos a maioria, não mudaremos os índices de
audiência nem inverteremos a lista dos mais vendidos. O que importa é manter
viva a chama da verdadeira arte, que afirma e preserva o que de melhor o homem
inventou para tornar-se humano.
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